Capítulo 2

Trechos do Livro
Pensamento Crítico e Argumentação Sólida

@ Copyright 2002 Sergio Navega

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Mas Afinal, Que É Um Argumento?

Se eu falar "choveu ontem" estarei afirmando algo. Pode ser verdade ou mentira, não importa. Também posso dizer que "todos os homens são mortais". A essas frases damos o nome de proposições. Elas são os constituintes fundamentais dos argumentos. Mas não podem ser confundidas com outros tipos de frase, como as questões -- "Qual a capital da Grécia?" --, as declarações -- "Eu vos declaro marido e mulher" --, as formas imperativas -- "Por favor, faça três cópias deste documento" -- e muitas outras. As proposições tem um caráter especial, o caráter de alegar ou propor uma idéia ou conceito. As proposições são as bases de sustentação na construção de um argumento. Mas o que é um argumento? Veja algumas das maneiras de definirmos:

Um argumento é uma alegação suportada por outras alegações

Um argumento são razões suportando uma conclusão

Então, um argumento é um conjunto de proposições que usamos para promover suporte (justificar, levar-nos a crer) na veracidade de uma conclusão (uma outra proposição).

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As proposições que estão à esquerda recebem o nome de premissas. São, na verdade, o ponto mais importante dos argumentos. A proposição à direita é a conclusão, aquilo que queremos alegar. Por essa definição, dá para perceber que nem todo tipo de comunicação linguística pode ser considerado como um argumento. Veja algumas construções que não são argumentações:

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Um argumento precisa necessariamente ter premissas e uma conclusão que poderia ou não ser verdadeira mas que, por força das premissas, pode ser inferida destas. Este é um exemplo típico de argumentação:

"Todos os Senadores do Congresso tem idade maior do que 35 anos. O Sr. José da Silva é um Senador do Congresso. Portanto, o Sr. José da Silva tem mais do que 35 anos"

Mas se em vez de dizer "Todos os senadores tem mais de 35 anos" você simplesmente estivesse dando um exemplo, como em "O Sr. Joaquim Silvério tem mais de 35 anos e é senador, portanto o Sr. José da Silva, que é senador, também tem mais de 35 anos", isto não seria suficiente para justificar a conclusão de forma sólida. Um exemplo não tem força suficiente para nos levar a crer na conclusão.

Da mesma forma, uma explicação também não possui o necessário para ser encarada como argumento.

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O Encargo da Prova

Vimos que quem propõe um argumento está alegando alguma coisa. Suas premissas são, idealmente, suporte à alegação que está sendo proposta. O Encargo da Prova é o princípio que afirma que aquele que está propondo a alegação é o responsável em providenciar seu suporte. Parece óbvio, não? Mas existem enganos frequentes derivados da má interpretação desse princípio.

Um desses enganos ocorre quando quem propõe uma alegação exige de quem a ouve a prova de que ele está errado.

"Minha teoria afirma que a Terra é, na verdade, oca e que há uma outra civilização morando embaixo da crosta"

"Puxa! Isso é bastante difícil de acreditar. Que evidências você dispõe mostrando que isso é verdadeiro? Não consigo acreditar nisso que você diz"

"Oras, porque você duvida do que eu disse? Qual a prova que você tem de que não pode haver uma civilização embaixo da crosta terrestre?"

Quem ouve a alegação não tem que provar -- nem refutar -- nada: esta é a posição na qual se é todo ouvidos, ou seja, quem está fazendo a alegação é que deve providenciar todos os suportes necessários. Cabe aos ouvintes apenas concordar ou questionar, dizendo, por exemplo, "Como foi que você concluiu isso?", ou então "Não concordo com essa premissa, justifique-a". Neste último caso, o argumentador deve providenciar um novo argumento para suportar a premissa. Vamos ver um caso prático acompanhando a seguinte discussão:

Pedro: "Charles é um cidadão britânico"
Isto ainda não é um argumento, é apenas a proposição conclusão

Maria: "Não entendi. Por Que?"
Maria está interessada em um argumento que a faça acreditar nessa conclusão.

Pedro: "Ora, Charles nasceu nas Bermudas"
Agora, Pedro propôs um argumento completo: "Como Charles nasceu nas Bermudas, Charles é britânico"

Maria: "Ainda não entendi, por que isso?"
Maria parece não ter detetado a relevância da premissa oferecida por Pedro. É obrigação dele esclarecer.

Pedro: "Todo aquele que nasce nas Bermudas, é cidadão britânico"
Pedro ofereceu novo argumento, neste caso para suportar a premissa da qual Maria tinha dúvidas.

O caso estaria resolvido com esta última intervenção de Pedro. Contudo, a discussão pode pegar fogo na medida em que as premissas vão sendo questionadas uma a uma. Neste caso, sabe-se que o arquipélago das Bermudas esteve sob domínio britânico desde 1612 e vem daí a nacionalidade britânica de todos os que nascem lá. Entretanto, a partir de 1968 foi dado ao arquipélago uma certa autonomia interna. Maria poderia, por exemplo, contestar a idéia de que Charles fosse britânico caso tivesse nascido após 1968, ao tentar interpretar a autonomia dada como um sinal de independência. Mas fazer isso significaria desafiar algo mais forte, que tem a ver com essa independência e não raro essas situações chegam, infelizmente, ao limite do conflito armado.

O Encargo da Prova tem uma interpretação ligeiramente diferente quando falamos de argumentação como tática de retórica. Aqui, o encargo da prova fica continuamente "oscilando" entre os dois membros do debate, como que uma "sombra" acompanhando o lado mais fraco. Mesmo que um argumento em especial não seja muito forte, se o lado que o propôs tiver uma melhor posição no debate, fará que o encargo da prova tenha que ser preocupação principal do outro lado.

O encargo da prova é um dos princípios básicos relacionado ao julgamento de pessoas pela Justiça. Assumimos, por princípio, que todo mundo é inocente até prova em contrário. Isto é uma das expressões do que significa o Encargo da Prova: ele está nas mãos do promotor e não do réu, ou seja, nunca este terá que "provar" sua inocência. O mesmo ocorre em relação à aprovação de remédios pelo FDA (Food and Drugs Administration) americano: o encargo da prova está sempre na mão das companhias farmacêuticas, e não no FDA.

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